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Qualidade de Vida no Ambiente de Trabalho – Parte 03

Dando continuidade à uma ampla análise da qualidade de vida no ambiente de trabalho por meio da espiritualidade corporativa.

Conforme a Organização Mundial de Saúde (OMS), o conceito de Qualidade de Vida (QDV) está ligado àquilo que o indivíduo sente em relação a sua posição na vida, voltado a sua cultura e aos valores pessoais no qual está imerso, colocando em destaque suas expectativas, objetivos, padrões e preocupações. (ORLEY& WHOQOL GROUP, 1994).

Conforme citado anteriormente, a psicologia positiva vem confirmar os benefícios do bem-estar e das emoções positivas. Na pesquisa empírica realizada por Lyubomirsky e sua equipe, evidenciaram que é possível potencializar o bem-estar do indivíduo em até 40%, devido às ações intencionais de atividades de engajamento, pois expressam um ambiente de otimismo e uma atmosfera de gratidão. (LYUBOMIRSKY, SHELDON, SCHKADE, 2005; SHELDON, LYUBOMIRSKY, 2006, 2007; KURTZ, LYUBOMIRSKY, 2008; LYUBOMIRSKY, 2007; BOEHM, LYUBOMIRSKY, 2009).

Segundo Bolman e Deal (1995), o ambiente de trabalho deve ser mais hospitaleiro, prestando serviços tanto para a organização quanto para a comunidade, e que o espaço de trabalho possa fortalecer o desempenho organizacional. Ainda nesta vertente, Conger (1997) e Dorothy Marcic (1997) reafirmam que as empresas que possuem sucesso, faz parte desse sucesso, principalmente o financeiro, a realização na organização de “valores espirituais na vida”.

Segundo K. Koonmee et al. (2010), durante a última década, os efeitos de fatores como o aumento da globalização, tecnologia da informação, a competitividade das empresas no mundo e os recursos naturais limitados mudaram a opinião das pessoas de como uma boa companhia é definida. No passado, os valores financeiros foram o principal fator na definição de “uma boa companhia”. Nos últimos anos, a ética, a qualidade de vida no trabalho (QVT) e a satisfação no trabalho são cada vez mais identificadas como indicadores progressivos relacionados com a função e sustentabilidade das organizações empresariais. A crescente complexidade do mundo dos negócios competitivo e complicado e o processo de implementação de leis sociais eficazes fazem com que a ética seja um fator estratégico importante para proteger as empresas contra desastres indesejados (por exemplo, BEAUCHAMP, BOWIE, 2004; CARROLL, BUCHHOLTZ, 2006; FERRELL, FRAEDRICH, FERRELL, 2008). Independentemente disso, pode-se argumentar que a boa ética é simplesmente um bom negócio.

LRN (2006a, p. 1): Culturas éticas criam confiança dentro e fora das organizações. Confiança incentiva à adequada tomada de decisão, o que leva à inovação, o que impulsiona o progresso e, finalmente, a lucratividade.

E sabendo que o trabalho é parte integrante da vida de todos, a contribuição das organizações passa a ser muito importante para o crescimento (mental) espiritual do indivíduo. Assim, o motivo pelo qual existe o interesse na espiritualidade no trabalho é decorrente de dois principais fluxos de desenvolvimento nos negócios, sendo um chamado “imperativo econômico-tecnológico” e o outro identificado como “Pessoas”, o qual está centrado na gestão, denominado Teoria YZ (MCLAUGHLIN, 1998). Burack ressalta que o fluxo do “imperativo econômico-tecnológico” foi a força impulsionadora no desenvolvimento das economias de escalas visando a uma maior produtividade. Neste recente cenário, o Downsizing e reengenharia estabelecem um novo modelo de vida. Entretanto, as organizações estão imersas num ambiente competitivo com redução no retorno econômico, onde a tecnologia não é mais segredo devido ao mundo globalizado e avançado em seus processos de informação, possibilitando o segundo fluxo de desenvolvimento “Pessoas” como sendo o grande diferencial competitivo. Pode-se citar, como exemplo, a Ford Motor Company, a qual realizou uma grande mudança nas abordagens, focando, assim, nas “Pessoas” (BURACK, 1993). Realinharam a empresa para a sobrevivência e sua ação foi o “enxugamento”. No início da década de 1980, acumulavam perdas financeiras aproximadamente de U$ 3 bilhões e reduziu milhares de empregos (BURACK, 1993, capítulo 6). Houve um realinhamento severo na estratégia da empresa permeando entre dez a quinze anos, mudando radicalmente o estilo de gestão da Teoria X – filosofia do fundador Henry Ford. O pensamento em que a pessoa era uma ferramenta integrante do processo foi substituído gradativamente por um novo conceito, elevando o ser humano com um recurso potencial. Esta nova visão desencadeou duas premissas fundamentais: a primeira, sendo a credibilidade corporativa com os colaboradores, clientes e consumidores; e a segunda, sendo o longo prazo, onde o sucesso do negócio seria a consequência do progresso, crescimento sustentável baseado nas pessoas. Foi um modelo praticamente inovador, baseado nas relações de confiança entre a alta administração e os funcionários, questões estas primárias para anteceder a credibilidade no relacionamento interpessoal. Esta nova abordagem de experiência de vida no ambiente de trabalho proporcionou um novo contrato social-psicológico alcançando resultados significativos ao longo dessa trajetória (BURACK, 1999).

Dessa forma, os novos papéis das relações interpessoais e a valorização dos recursos humanos fomentaram uma nova importância, isto é, as pessoas são o centro, e este recurso é construído por capacitação e centrado em atividade de equipe (ULRICH, 1998; JAFFE, SCOTT, TOBE, 1997).

O surgimento de novas formas de gestão orientada para “Pessoas” está sendo muito rentável nos últimos anos, pois visa ao equilíbrio entre negócios e trabalho alcançando alta produtividade e rentabilidade (VAILL, 1989).

A nova abordagem centrada nas “Pessoas” é o princípio para equilibrar alguns elementos, tais como: física (equipamentos, remuneração e segurança); intelectual (aprendizagem, capacitação, treinamentos); emocionais (relações interpessoais, desenvolvimento emocional e comunicação – feedback); proativa (vontade para mudar e boa adaptação às novas exigências ou condições); e espiritual (ética, a empatia para as pessoas, a justiça e a dignidade individual). Estas dimensões são totalmente interdependentes, por isso devem ser balanceadas uniformemente e dinâmicas para obter respostas e rápidas mudanças de estratégias para se chegar ao sucesso da organização (MARCIC, 1997, p, 31-43).

O foco nas pessoas serviu como o princípio de novas práticas na organização na gestão de qualidade no trabalho, nas políticas, nos processos e na cultura. Fundadores e empresários de empresas, tais como: Hewlett-Packard e Fel-Pro visavam ao comprometimento dessas práticas, nas quais originaram a “Theory YZ” – reflete as contribuições de Douglas McGregor (1960: Teoria X e Teoria Y) e Bill Ouchi (1980: Teoria Z).  E o legado espiritual: uma visão pessoal “eu acredito que o mundo em que vivemos é regido por várias leis, física, espiritual, biológica e celular, e a bondade essencial de muitas pessoas são exemplos de coisas que não entendemos completamente, mas eu não entendo por que eles estão lá e eles trabalham e formam uma parte essencial de nossas vidas” (MARCIC, 1997, p. 2-44).

Com o surgimento da Teoria YZ, cria uma nova aplicação de espiritualidade no ambiente de trabalho. Focada em quatro diferentes resultados, seu pensamento subdivide-se em:

 

  1. Liderança e organização: preocupação voltada para os colaboradores, respeito mútuo, respeito pelos outros, atitudes dignais, leais e maduras.

 

  1. Funcionários: habilidade em desenvolver suas competências, promovendo a qualidade de trabalho, conhecimento e alta performance sustentada pela adaptabilidade.

 

  1. Externo (constituintes estratégicos): qualidade, consistência, consciência ambiental.

 

  1. Membro responsável da comunidade: mútua confiança e partilha de responsabilidades com benefícios comuns.

 

Face ao fator espiritualidade a qual proporcionava resultados satisfatórios, houve muitas empresas adeptas a este modelo de gestão, pois perceberam, nas últimas décadas, que considerações da Teoria X (pessoas como instrumentos de trabalho, direção centralizada) não atingem mais os objetivos. Mesmo com a tecnologia, reengenharia de processos, reestruturação,  havia na organização suas lacunas e com isso emergiu a necessidade da utilização de novas formas de administração estratégica de pessoas. A estratégia foi baseada no empoderamento individual (empowerment), mas este não atingiu sua magnitude, pois estava faltando a autêntica confiança do indivíduo com a organização. Ciente de novos sistemas, capazes de alterar rapidamente as condições de dependência da equipe, o empoderamento possibilitou à organização ganhar um novo prêmio, ou seja, o empregado teve um maior comprometimento no trabalho focado nos objetivos. (CONGER, 1989; MEYER, ALLEN, 1997; SCHUSTER, 1998; WOOD, BANDURA, 1989). Segundo Burack e Mathys (1998), muitas empresas foram classificadas em pesquisas nacionais entre os melhores “lugares para se trabalhar”, pois visavam, em longo prazo, aos lucros, tornando um grande sucesso organizacional, tema abordado nesta pesquisa. Mesmo havendo um grande número de empresas ancoradas na Teoria X, muitos funcionários exerciam suas opções de escolhas de emprego para aquelas que estavam comprometidas com o alto desempenho do empregado (BURACK, 1993; MEYER, ALLEN, 1997).

E seguindo esse pensamento sistêmico, a Hewlett-Packard, pertencente ao pequeno círculo das empresas mais conceituadas nos Estados Unidos, integrou a visão do espírito empreendedor de seus fundadores Bill Hewlett e Dave Packard. Até meados de 1970, a H-P era reconhecida pelo sucesso de uma grande empresa de instrumentos de medição de precisão. Após décadas, houve a necessidade de inovar, chegando à liderança mundial em computadores em 1990. No entanto, desde a sua fundação em 1939, a sua cultura organizacional em nível global, praticou um ambiente de trabalho moldado nas atitudes de relacionamentos, sistemas de compensação, comunicações e iniciativas de funcionários e oportunidades de atendimento. O alicerce deixado pelos fundadores foi a forma de gestão altamente descentralizada, visando objetivos a curto e longo prazos, facilitando novas oportunidades para os funcionários (BURACK, 1999).

 

Neste cenário, estão surgindo novas organizações assumindo novos papéis, isto é, enfatizando relações colaborativas, como contatos pessoais entre os funcionários e entre funcionários e gerentes, onde eram, muitas vezes, transacionais ou mesmo inexistentes (SHAW, 1997). Contudo, é necessária uma rápida reinvenção da gestão da organização, onde os ambientes de trabalho, que tiverem uma melhor qualidade de vida no trabalho e conscientização dos funcionários, conseguirão o prêmio de enfrentar os problemas com uma resolução destes mais rápidos, uma alta capacidade de adaptação, um veloz processo de melhoria contínua e contará com funcionários dispostos a trabalhar mais horas para o desenvolvimento organizacional (BEHLING, 1998, p. 82-4). Pesquisas apontavam, também, que nem sempre é fácil trazer da teoria para a prática, pois menciona que a confiança na gestão está corroída em relação ao funcionário e com isso, a desconfiança cresceu (SHAW, 1997, p. XI). Este sentimento leva a resultados medíocres, surgindo a crítica na comunicação organizacional, nos processos e nos relacionamentos. Tornar superficiais o relacionamento e a comunicação faz com que a organização perca tempo em administrar os conflitos, pois merece respostas rápidas para as mudanças ambientais. (SHAW, 1997, p. 11-14).

A reflexão de que o indivíduo é um sentido de espiritualidade no trabalho “verdadeiro trabalho, vem de entes do próprio ser” (FOX, 1994). O último pensamento de que a bondade e ser são intercambiáveis (p. 81), onde a cultura da organização ou ambiente é propício para a espiritualidade, também o funcionário assume a expressão da espiritualidade, “Porque desafia os limites do ser e se estende para o […] espiritual horizonte” (FOX, 1994, p. 82). A percepção por alterações no ambiente de negócios se deve a mudanças dramáticas em andamento nos ambientes de trabalho, forçando as empresas a inovarem radicalmente os seus processos e a sua estrutura organizacional. Esta reinvenção estrutural teve seus impactos externos, como a globalização, a concorrência, o envelhecimento da população, a depredação ambiental, onde houve a necessidade de formatar uma nova arquitetura organizacional (sistemas e processos), manter o foco para a tomada de decisão,  o trabalho e as características de estilo de vida dos indivíduos. (BURACK, 1993).

Portanto, o novo contexto das pessoas nas organizações tem estimulado a atração e retenção de pessoas, com o objetivo de desenvolver competências diferenciais em relação aos concorrentes e às necessidades futuras (FLEURY; FLEURY, 2004).